domingo, 13 de abril de 2014

Jacques-Alain Miller, dois textos e um segredo

No recente Colóquio sobre Slavoj Zizek - «Viver Perigosamente» (Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, dias 10 e 11 de abril), José Martinho, psicanalista da Associação Mundial de Psicanálise (AMP) e da New Lacanian School (NLS), além de fundador em Portugal da Antena do Campo Freudiano (ACF), relembrou a certa altura que Zizek esteve bem orientado desde o princípio, uma vez que conviveu com os melhores alunos de Lacan, em particular com Jacques-Alain Miller. É o próprio Slavoj Zizek que reconhece esta dívida, aqui e além, nos seus livros e entrevistas, mesmo se nos últimos anos se tem vindo a acentuar uma rotura entre ambos.Não é disto, porém, que eu gostaria de falar; em vez disso, lanço uma questão: quem é Jacques-Alain Miller?

Muita coisa se poderia escrever como resposta. Antes de mais, que foi o genro e legatário da obra de Lacan. É ele que tem vindo a estabelecer, desde há vários anos, os seus escritos e seminários, além de animar um seminário de Orientação Lacaniana que tem sido uma autêntica forja e, sobretudo, uma bússula para todos aqueles que procuram orientar-se no ensino de Lacan, tanto na sua vertente pura como aplicada, quer dentro como fora de muros. Poderia dizer isto e muito mais. A importância do trabalho de Jacques-Alain Miller - movido por um desejo a toda a prova - tem vindo a crescer de dia para dia. Mas não é dessa forma geral, reconhecida por todos, mesmo por aqueles que discordam muitas vezes das suas posições ou decisões, que eu gostaria de falar. Lanço antes a questão: quem é, para mim, Jacques-Alain Miller?

Como muitas vezes aconteceu na minha vida e na mais diversas ocasiões - daí o título do blogue - foi ao pé da letra que eu primeiro conheci Jacques-Alain Miller. A começar por um texto, digamos, introdutório, que se chamava Recorrido de Lacan (em espanhol) e onde se reuniam diversas conferências realizadas por J.-A. Miller em Caracas (1979), Bruxelas (1981) e Buenos Aires (1981). E desde logo ficou absolutamente claro, para mim, que ser lacaniano era perfeitamente compatível com um estilo - nesse aspeto bem diferente do estilo gongórico do próprio Lacan - que não primava pelo hermetismo, mas antes pela clareza. Jacques-Alain Miller tem a capacidade única de ser ao mesmo tempo profundo e leve, simples e rigoroso, preciso e denso. O seu estilo, cristalino, é a melhor forma de prosseguir aquilo que Lacan chamava, algures, no Seminário X, um ideal de simplicidade, apanágio de todo o verdadeiro ensino. Mas não é disso que eu gostaria de falar, nem das dezenas de textos que li posteriormente ou das conferências memoráveis a que pude assistir em Paris; uma delas lendária porque me fez chegar atrasado ao avião, perdê-lo, e ter de pagar mais na viagem de volta do que teria pago por toda a viagem de ida e volta.

Não, não é isso. Aquilo que eu gostaria, mais do que falar de Jacques-Alain Miller, é de dar dois exemplos. Dois textos recentes que servem, como nehum outro, de fio de Ariana para entrar sem receio de vir a perder-se num labirinto chamado ensino de Jacques Lacan, em particular no Seminário VI, O Desejo e a sua Interpretação. Com a garantia de que há lá um segredo. Qual?

Aqui deixo as traduções que fiz (naturalmente discutíveis) dos textos em causa.

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